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Sete propostas para salvar a livraria mais antiga do Brasil

Fundada há 179 anos em Campos, Ao Livro Verde corre o risco de fechar as portas. Mas especialistas em vários segmentos apontam soluções para evitar que isso aconteça.

O Brasil ainda vivia o período imperial quando a livraria Ao Livro Verde foi fundada em Campos dos Goytacazes. O ano era 1844. De lá para cá, o mundo vivenciou diversos períodos políticos, sociais e econômicos. E a livraria, que é a mais antiga do país – com confirmação no Guinness Book – sobreviveu a todos eles, até 2023. Hoje, principalmente com as consequências das mudanças tecnológicas, seus atuais proprietários anunciaram a falência do ‘antigo’ modelo de negócio. Mas a livraria virou patrimônio histórico nacional, e deixá-la morrer será uma relevante perda cultural. Os caminhos para a salvação de Ao Livro Verde podem ser diversos – alguns deles já sendo traçados.

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Especialistas nas áreas de educação, jornalismo, educação, economia e comércio, entre outros, foram ouvidos por Notícia 1 durante a semana. Esta reportagem apresenta algumas propostas sobre o que precisa ser feito para que a livraria sobreviva.

Sylvia Paes – historiadora, professora, diretora na Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima (FCJOL) – A Campanha SOS Ao Livro Verde, que envolve toda a sociedade civil nesse projeto de salvamento da livraria mais antiga do Brasil, é muito interessante, envolvente, é afetuosa. Nos traz à lembrança a necessidade de estarmos protegendo o patrimônio cultural como um todo, mas é muito romântica. O romantismo é ótimo, mas não salva quando se trata de dinheiro. Nós vivemos numa sociedade capitalista, onde o dinheiro é quem comanda ou tem comandado muitas ações. Então, o que é preciso ser feito para salvar a livraria? Pagar a dívida. Esse é o primeiro ponto. Sem romantismo. É cruel até a gente trabalhar sem romantismo, mas essa é a verdade.

Eu também estou querendo sentar junto com o pessoal do SOS Ao Livro Verde para pensarmos numa solução de uma parceria público-privada que possa salvar Ao Livro Verde como marca, inclusive. Porque a marca é um patrimônio de uma pessoa, mas ela não é uma marca e-commerce, ou seja, ela não tem projeção fora do mercado local. Não é uma marca comercializável. Ela não tem muito valor de mercado e o prédio é de um outro grupo. Então fica difícil isso. É uma equação matemática arriscada, perigosa e tem que ser pensada com muita calma, com muita racionalidade. Sem tanta emoção. A emoção precisa mover o raciocínio, mas ela não pode dominar o raciocínio num momento como esse. Porque a gente está pensando num hoje para sempre.

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Edmundo Siqueira – Agente Cultural, jornalista e pesquisador – Acho que a livraria Ao Livro Verde sofre dois problemas: um seria a crise do mercado livreiro, com o fechamento de tantas livrarias. O outro é por ser um patrimônio histórico em uma cidade que infelizmente dá pouco valor a isso. Vimos isso acontecer com o antigo Trianon, e estamos vendo com o Solar dos Ayrizes. Por outro lado, a livraria é uma empresa particular, e como tal não pode receber dinheiro público para que suas contas sejam sanadas.

Mas acho que o poder público pode ser um indutor de soluções para esse caso. Trata-se da livraria mais antiga do Brasil, um patrimônio histórico cultural que pertence a todos os campistas. Ali poderia ser uma biblioteca municipal, já que a Biblioteca Nilo Peçanha está fechada. Poderia também ser um centro cultural público. Ou ainda um local que reativasse o jornal Monitor Campista, que pertence à municipalidade. Enfim, existem caminhos, mas é preciso que a prefeitura se engaje e faça parte do movimento que se criou. A desapropriação do prédio é um caminho inevitável para que esse patrimônio se mantenha. Existem caminhos jurídicos e legislativos para essa ação, mas é preciso que prefeitura e câmara se movam.

Vitor Menezes – professor, escritor, jornalista, vice-presidente da Associação de Imprensa Campista (AIC) – Uma coisa é imaginarmos como pode ser uma livraria hoje para ser atraente e competitiva. Quase sempre isso passa por ser uma experiência diferente, em que valha a pena estar presencialmente. Muitas soluções podem ser pensadas neste sentido, mas todas dependem de investimentos. A realidade imediata, no entanto, é outra. A urgência é evitar que feche. E, se fechar, providenciar uma abertura a curtíssimo prazo para que não se perca a sua continuidade e vínculo cultural e afetivo. Neste segundo caso, dado o aparente desinteresse comercial vindo do setor privado (sem que tenha havido, até onde sabemos, alguma proposta de compra), resta ao poder público assumir o protagonismo que já deveria ter assumido e encontrar caminhos republicanos, legais e justificáveis socialmente para salvar a livraria.

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Temos conversado no movimento SOS Ao Livro Verde em soluções que passam pela criação de uma Fundação Ao Livro Verde. Há quem defenda uma fundação privada, como a Fundação Cultural de Campos (mantenedora do Uniflu) ou a Fundação Benedito Pereira Nunes (mantenedora da Faculdade de Medicina e do Hospital Álvaro Alvim). Seja qual modelo for, essa fundação ficaria responsável por manter a livraria, modernizá-la (tanto fisicamente quanto digitalmente) e associá-la a ações de incentivo à leitura, divulgação dos autores e das autoras campistas, projetos culturais, entre inúmeras possibilidades.

Wellington Cordeiro – presidente da Associação de Imprensa Campista (AIC) – Precisamos inicialmente, e está sendo feito, é a busca por uma mobilização popular e institucional. A petição popular que está sendo difundida nas redes sociais para coleta de assinaturas tem atingido números positivamente surpreendentes na avaliação da comissão organizadora da Campanha SOS Ao Livro Verde. Não podemos repetir a inércia que deixou o antigo Teatro Trianon ser destruído e que também deixou o Jornal Monitor Campista encerrar as atividades. Esse abaixo-assinado solicitará ao Poder Executivo Municipal e à Câmara de Vereadores de Campos a formação urgente de equipe técnica especializada com o objetivo de estudar, avaliar e propor alternativas que impeçam o fechamento da Ao Livro Verde.

São os poderes constituídos de nossa região que terão força para abrir caminhos para diálogos com instituições culturais de grande porte, como os espaços culturais de bancos como Caixa Econômica Federal, Itaú, entre outros. Também com esferas políticas estaduais e federais. Acredito que o futuro da Livraria Ao Livro Verde não sobreviverá apenas sendo seu papel histórico que é o comércio de livros. Isso a internet já faz em uma concorrência difícil de enfrentar. A Ao Livro Verde teria que se transformar. Talvez num Centro Cultural, mantido por uma fundação a ser criada, para ter condições de realizar parcerias público e privadas. Mantendo, dessa forma, a livraria com o importante patamar de mais antiga do Brasil.

Adelfran Lacerda – jornalista, diretor do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Rio de Janeiro (SJPERJ), um dos idealizadores do Comitê Organizador da Campanha SOS Ao Livro Verde – A representatividade da livraria Ao Livro Verde é muito grande, é histórica para todo o Brasil, uma referência cultural também e a sociedade civil campista entendeu isso de uma maneira unânime. Nós já temos mais de 1.800 assinaturas no abaixo-assinado para impedir o fechamento da livraria e o apoio oficial de 50 instituições. Praticamente todas as instituições de Campos dos Goytacazes, muitas da região também. E isso prova a estima, o carinho, o respeito que a população tem com essa livraria.

Qual será nosso segundo passo agora? Será concluir esse abaixo-assinado. Acho que no máximo em 30 dias a gente conclui. E entregar às autoridades públicas. Ao poder legislativo e ao poder executivo. O Comitê Organizador da Campanha SOS Ao Livro Verde entende que vai ser um gesto de apoio da sociedade civil ao poder público municipal, tanto executivo quanto legislativo – juntos nessa luta – para, aí sim, através de uma comissão técnica especializada, que deve ser formada urgentemente, a gente estude as propostas que já foram feitas, avaliar novas propostas e definir quais são viáveis para a execução concreta e impedir o fechamento da livraria.

No momento, o que mais prospera na campanha SOS Ao Livro Verde é que ela seja transformada na Casa de Cultura Campista na Livraria Ao Livro Verde. Concomitantemente, seria formada a Fundação Cultural Livraria Ao Livro Verde e com essa personalidade jurídica própria, com CNPJ zerado, ela pode receber contribuições tanto da iniciativa privada como do poder público. E da iniciativa privada nós estamos focando em encontros, reuniões, entendimentos que deverão ser marcados com a Fundação Cultural Banco do Brasil, com a Fundação Cultural Caixa Econômica Federal, com a Fundação Cultural do Banco Itaú, que já tem diversas casas de cultura, museus e locais de exposição pelo Brasil afora e, ainda, com instituições de grande porte como Petrobras, Firjan, Porto do Açu e também instituições como Sesi, Sesc, o Senai, ou seja, seria o regime de parceria público-privada para fazer a gestão dessa Casa de Cultura.

Alcimar das Chagas – economista e professor da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Uenf) – Trata-se de um empreendimento privado, primeiro. Se é privado, a responsabilidade é por manter o negócio sempre no mercado, de maneira inovativa, etc; a forma é acompanhar as mudanças que vão ocorrendo naturalmente. Todo negócio sofre mudanças muito radicais com o tempo e as livrarias infelizmente sofreram muito com a tecnologia. É uma dinâmica natural em função da trajetória da inovação. Quem tem que ficar atento é o empresário. Nesse caso, então, depende da família que ficou com o negócio olhar e ver caminhos alternativos, como outras fazem também no mundo afora. Não acho que é uma questão do poder público. Eu acho que é uma livraria muito antiga, centenária, mas o poder público acho que não teria nenhum papel a exercer para manter vivo um negócio como esse.

Vejo com muito pesar o esvaziamento de qualquer negócio porque tem um conjunto de empregados antigos que vive do negócio e isso é uma coisa muito chata, realmente. Mas, infelizmente, isso é o mercado. É o sistema que a gente vive hoje. O sistema capitalista é assim. O mercado possibilita que você tenha todo o direito de empreender e também buscar sempre uma condição de competitividade perante os seus concorrentes e perante as mudanças que ocorrem no próprio mercado.

Jefferson Manhães – Reitor do Instituto Federal Fluminense (IFF) e presidente e do Fórum Interinstitucional de Dirigentes do Ensino Superior de Campos (Fidesc) – Acredito que alguns projetos poderão ser desenvolvidos para auxiliá-la nesse momento de dificuldade. O poder público municipal poderia implementar um projeto de oferta de um vale cultura para os professores da rede municipal, em parceria com a livraria, para que os professores tivessem acesso à aquisição de livros. Outra possibilidade seria o de adaptação do espaço para saraus, declamação livre de poesias, palestras, noite de autógrafos, rodas de leitura, cafés literários, em parceria com as instituições de Educação de Campos dos Goytacazes e com as Academias.

Muitas são as possibilidades, desde que haja criatividade, mobilização social e vontade política. Campos hoje é um polo universitário e não pode perder mais esse patrimônio histórico, principalmente uma livraria, como vem perdendo em outras áreas, nas últimas décadas. Defender a preservação de Ao livro Verde é posicionar-se em favor da cultura, da história e do patrimônio campista, do futuro e da sobrevivência desse marco na história do país!.

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